quarta-feira, 28 de julho de 2010

Sem título



Noctívago andante, pelas ruas segue com receio, olha para os lados como se fosse perseguido.

Cruza uma esquina sem olhar para os carros, perturbado com o que acabara de acontecer. Com as mãos ensangüentadas, segura ainda a faca, com a qual acabará com a sua vida, e a de outra pessoa. Passional cometeu o maior ato que uma pessoa poderia cometer, matou. Sendo o maior também é o pior.

Mas ele se lembra do dia mais feliz que teve, não foi a muito tempo, há recente uma semana ele atravessava essa mesma avenida que o vê correr com sangue nas mãos, e esbarra com ela. Parecia até cena de cinema, as coisas que ela carregava caíram ao chão, e como em cidade grande não há vida que imite arte, o sinal abria e os carros avançavam a buzinadas na direção dos dois. Todo o material que ela carregava, material que trazia de sua aula de artes, a qual também era sua profissão, foi atropelado, restaram papéis amassados com marcas de pneu, radial Pirelli, ou Michelin, não importa mais agora, qualquer que fosse a marca do pneu não importaria justamente pelas marcas de sangue que trazia nas mãos e na camiseta.

Ela tinha um nome exótico, que também não importa mais, o nome que ele trazia era comum, para não dizer comum ao extremo. O esbarrão fez com que nascesse uma grande cumplicidade dele para com ela, moça simples, que mesmo com seu material de estudo amassado e com lágrimas nos olhos por ter perdido um semana de trabalho, não perdeu os bons modos que tinha e aceitou o pedido de desculpas desconsolado que ele lhe fazia. A única coisa que ela tinha às mãos eram os pincéis que ele conseguirá retirar antes que ela o puxasse para a calçada para que não morresse atropelado.

Surgiu uma grande cumplicidade entre os dois, mas não a primeira vista como ocorre no cinema, foi necessário que se esbarrassem novamente, dessa vez com menos intensidade e na calçada. Ele pediu o telefone dela, ela não lhe deu, mas marcaram de se encontrar no mesmo dia ao anoitecer, num barzinho muito perto de onde tiveram o primeiro encontro trágico.

Para parecer mais gentil do que realmente era, ele trouxe um pequeno ramalhete de flores e uma tela de pintura. Pedindo mil desculpas novamente, mas assim como no cinema, que foram após um café, não quis que as coisas houvessem ocorrido diferente. Assim conheceu ela. Que aos poucos, e foi muito pouco tempo, tornou-se uma pessoa muito querida, pensava nela como uma mulher, queria estar perto dela, fixava seu olhar quando ela não estava vendo no seu rosto, mas não deixava de olhar para seu corpo.

Ela começou a gostar dele pelas flores e principalmente pela tela que lhe trouxera. No café cada um pagou o seu, e no cinema ele bancou o cavalheiro pagando as duas entradas, mal sabia ela que era sua última verba do mês, mas receberia dali uns dias, então marcaram de se encontrar novamente, no sábado, era quarta feira.

Ele já haveria recebido e ela marcou de levá-lo em uma exposição de colegas, na qual ela também expunha um quadro.

Inicialmente era uma paisagem simples, uma casinha, uma pequena paisagem a beira do lago, mas depois de todos os acontecimentos envolvendo ele, não pôde mais.

Quando na quarta-feira recebeu a tela como pedido de desculpas pintou furiosamente o quadro, as tintas pingavam da tela, inicialmente o que pareceria uma forma abstrata de arte ia tomando forma, o mesmo vermelho vivo que mancharia as mãos dele uma semana depois, brotava vida da tela, flores. Quanto mais vermelhas pintava, mais parecia estar viva. A fúria que pintava a tela, tornava a inflar seu coração. Não de raiva, mas de excitação. A tinta na tela, manchando seu macacão, a fez pensar mais e mais nele. As cerdas do pincel que usava ficavam na tela, a cada rosa que desenhava pensava mais e mais nele, a cada pétala que tirava de sua mente, sentia esquentar o seu corpo. Pensava nele.

Na mesma quarta-feira que foi ao cinema com ela, viu-se a luz do luar no terraço do prédio onde morava. A lua estava cheia. Fazia muitos anos que não pegava seu violão velho, totalmente desafinado, tratou de fazer o melhor que pode para deixar o som audível. Cantou para os gatos da vizinhança que saiam para festar a madrugada. Já havia pensado em ser como aqueles gatos que muitas noites de solidão haviam lhe feito companhia. Mas não naquela noite. Naquela noite era um amante, mas ainda solitário.

No sábado ele e ela se encontraram na fatídica esquina, que os marcou tanto. Seguiram para a exposição. Vendo os quadros dos colegas dela, ele se sentiu excluído daquele mundo. Conhecia a linguagem da musica, mas não tão bem, pra ser sincero, quase nada. No mundo dos quadros só via, passava a sua frente, casa, cachorros, abstrações. Porém não viu, mas ao se aproximar das rosas dela, sentia seu corpo arder. O tempo estava quente sim, mas não era calor, era uma animação sem tamanho, achou que as obras estavam fazendo isso com ele, porém teve a certeza que era uma obra e sua artista que o estavam encantando.

Naquela noite amaram-se loucamente, como ele nunca havia feito, mesmo porque recorria muitas vezes ao sexo pago para como dizia aliviar a tensão. Ela jamais havia sentido tamanha emoção e prazer, com ninguém que havia se deitado. A vida havia lhes proporcionado um grande presente, mas cobraria amargamente.

Ela não voltou a ligar para ele. Aturdido não sabia o que estava acontecendo. Ligou várias vezes, o telefone tocava e ninguém atendia. Passaram-se um, dois e nada. Quando completava uma semana do primeiro esbarrão, ele não agüentou mais, sabia onde ela estudava, foi esperar ela na saída do atelier. A viu saindo com outro rapaz de mãos dadas. Ela o viu. Fez sinal que ligaria para ele. E assim aconteceu.

O telefone soou. A dor em seu peito e a dúvida de atender ou não. Atendeu. Era ela. Explicou-lhe que aquele rapaz com que a vira era seu namorado. Há muito não o via. Ele apareceu de surpresa na mesma noite que se amaram. Ela estava criando coragem para contar-lhe a verdade. Mas não sabia se o que sentia era correspondido. Ele ratificou que o que sentia era mais que real, e que nunca havia sentido isso antes.

Então ela lhe disse, que aparecesse na sua casa dentro de duas horas que ela já teria contado ao outro rapaz e que esse já teria ido embora.

Ledo engano.

Antes tivesse esperado mais um dia, que era o prazo que esse outro permaneceria na cidade. Viera para fechar um negócio, e ficaria duas noites na cidade, chegara no domingo pela manhã, e partiria na terça feira. Na segunda feira a noite quando ela havia combinado de encontrar ele dali a duas horas ocorreu o que não deveria ter acontecido na vida dos dois amantes.

Ela contara tudo ao outro rapaz. Esse não conseguia aceitar a verdade. Ameaçara ela. Com uma faca cortou o seu rosto, a torturou psicologicamente até que falasse onde morava ele. Contou forçada. Quando estava saindo de casa ele se deparou com o outro rapaz. Com a mesma faca que ela fora ferida ele também foi. Uma perfuração pelas costas. Caiu ao chão. Com a faca ao seu lado. A dor imensa, que o rasgava só era menos que o sentimento que tinha por ela, no momento que levou a facada lembrou dela, e imediatamente ficou preocupado com sua situação.

O outro rapaz disse algo como amaram-se juntos e agora sofrem juntos. O sangue que estava em seu corpo esquentou, pegou a faca e não se importou com mais nada. Esfaqueou o outro rapaz como se disso dependesse a sua sobrevivência, e de certa maneira dependia. Pensou em vingar a recém descoberta amada, logo desfez essa imagem e correu para vê-la.

Atravessou a mesma avenida, ensangüentado, manchado com o mesmo tom de vermelho que guiou a recém descoberta atração, o vermelho do sangue se misturou ao vermelho da tinta, e manchou para sempre a vida daquele casal.

terça-feira, 27 de julho de 2010

Novamente uma nova etapa, ou, variações sobre uma mente em transição, ou não.


Nossa vida é feita de novas etapas... Algumas mais alegres, outras mais tristes, essa é uma etapa pessoal. Muito particular, e, ao mesmo tempo, publica, já que posto aqui para quem quiser ver/ler.
Escrever é algo que faço por prazer, por trabalho. Mas quando fazemos obrigado, algo que é um prazer, se torna chato.
A dissertação está batendo a porta. E escrever já não será somente um prazer, mas um projeto de vida.
Então, aqui nesse espaço, que não é somente meu, o qual compartilho com meu amigo Zeca, e com todos e todas que estiverem afim de ler, ou com saco para isso.
Quando ontem 27/07 escrevi um pequeno texto sobre meu posicionamento contra sobre um projeto/lei, senti novamente o prazer da escrita. Sempre que podemos escrever algo para expor nossas idéias é realizador. A Michele elogiou, os colegas que leram de certa meneira também, então, é mais um motivo para voltar a escrever.
Poesia, música, cinema, arte, de volta ao início, sem rádio como havia antes, mas com o mesmo projeto... Escrever e pensar a vida com tudo que ela tem!